
Justiça
TJ da Bahia pauta julgamento que vai definir futuro de 1,7 mil trabalhadores da construção civil
Caso envolve mudança de foro da recuperação judicial formalizado junto à Justiça e aos credores do Grupo Metha, atual nome da antiga OAS; análise será feita três dias antes da aposentadoria da relatora

Foto: Divulgação
O Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) deve julgar nesta terça-feira (21) o agravo de instrumento em um processo que pode decidir o destino de mais de 1.700 trabalhadores vinculados ao Grupo Metha S.A, nome atual da antiga OAS e que se tornou símbolo das fragilidades do sistema de recuperação judicial no país. O caso está sob relatoria da desembargadora Lícia Pinto Fragoso Modesto, cuja aposentadoria compulsória está prevista para ocorrer três dias após a sessão.
O detalhe temporal adiciona tensão a um julgamento já marcado por forte repercussão política, social e econômica, cujos efeitos travaram pagamentos e podem gerar desemprego De acordo com o Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil e Montagem Industrial da Bahia (Sintepav-BA), o plano de recuperação judicial aprovado em abril previa o pagamento de créditos trabalhistas em até 30 dias após a homologação e a quitação de valores até 150 salários-mínimos em 12 meses.
A transferência do processo para São Paulo, determinada pela Terceira Câmara Cível do TJ em agosto, suspendeu esses pagamentos, deixando milhares de trabalhadores sem previsão para receber verbas rescisórias e salários atrasados. Em petição ao tribunal, o Sintepav argumentou que a decisão “ignora o estágio avançado do processo e os impactos sociais sobre a coletividade de credores trabalhistas”, pedindo que a Justiça baiana mantenha a competência da 2ª Vara Empresarial de Salvador para “garantir a função social da empresa e a preservação de empregos”.
Impasse jurídico pode levar antiga OAS à falência
O Grupo Metha, que acumula passivos superiores a R$ 6 bilhões, vinha conduzindo sua reestruturação sob supervisão da Justiça baiana desde 2023. O plano já aprovado pelos credores foi interrompido após decisão que reconheceu a competência da Justiça paulista, sob o argumento de que a transferência da sede da empresa para Salvador configuraria “forum shopping”. O termo se refere à prática de escolher estrategicamente um tribunal ou jurisdição para iniciar um processo, visando julgamento mais favorável com base em leis mais benéficas, custos menores, procedimentos mais rápidos ou para explorar lacunas legais.
A reviravolta, segundo advogados e especialistas, colocou o processo em limbo e reacendeu o risco de falência da companhia, além de afetar toda a cadeia produtiva da construção civil. Reportagens publicadas na imprensa baiana destacaram que a disputa judicial “amplia a insegurança de credores, fornecedores e trabalhadores”, podendo extinguir a chance de recuperação da empresa.
O presidente do Sintepav na Bahia, Iraílson Gazo, afirma que cerca de mil trabalhadores filiados estão diretamente impactados pelo impasse, com prejuízo milionário: “A gente está falando de um prejuízo grande, enorme. Não é fácil. O processo avançou, os trabalhadores estavam prestes a receber. Agora tudo volta à estaca zero”, disse o sindicalista, em entrevista ao jornal A Tarde. Gazo reforça que o sindicato vê a recuperação judicial como a “única alternativa concreta para garantir empregos e pagamentos” e teme que a indefinição leve à extinção das obras e contratos ainda ativos do grupo.
Pressão política e questionamentos sobre o timing
A coincidência entre a pauta do julgamento e a aposentadoria iminente da relatora Lícia Modesto não passou despercebida. Internamente, advogados e representantes de trabalhadores questionam se há pressa incomum para encerrar o caso antes da saída da magistrada, que já foi alvo de críticas públicas por decisões consideradas “abruptas” em agosto — quando, segundo consta em ata notarial, teria incluído voto no sistema antes da manifestação das partes. Nos bastidores, a movimentação é vista como um “último ato” que pode alterar profundamente o desfecho de um dos maiores processos empresariais em curso na Bahia.
A decisão da Terceira Câmara Cível servirá de precedente para outras recuperações judiciais em curso e pode redefinir o entendimento sobre o critério de competência territorial — ponto central de disputas semelhantes em grupos como Odebrecht (Novonor) e João Fortes. Economistas e juristas alertam que, caso o processo da Metha permaneça travado entre Bahia e São Paulo, o resultado será desemprego em massa e insegurança jurídica para todo o setor da construção pesada, que ainda tenta se reerguer após a Operação Lava Jato.
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