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Torcida mista em Ba-Vis: retrato do passado ou esperança pro futuro?

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Torcida mista em Ba-Vis: retrato do passado ou esperança pro futuro?

O maior clássico do Norte/Nordeste acontece neste final de semana. Bahia e Vitória se enfrentam em duelo válido pela briga no G-4 da Série B. No entanto, a partida de longe se parece com os antigos confrontos entre as duas maiores forças do estado. Retrato fiel do real significado da palavra "torcer", a Fonte Nova (não a Arena) era símbolo de uma época onde torcedores comemoravam e brincavam com os rivais lado a lado em um estádio. [Leia mais...]

Torcida mista em Ba-Vis: retrato do passado ou esperança pro futuro?

Foto: Manu Dias/Secom/GOVBA

Por: Camila Tíssia e Matheus Simoni no dia 03 de outubro de 2015 às 08:30

O maior clássico do Norte/Nordeste acontece neste final de semana. Bahia e Vitória se enfrentam em duelo válido pela briga no G-4 da Série B. No entanto, a partida de longe se parece com os antigos confrontos entre as duas maiores forças do estado. Retrato fiel do real significado da palavra "torcer", a Fonte Nova (não a Arena) era símbolo de uma época onde torcedores comemoravam e brincavam com os rivais lado a lado em um estádio.

Diante do novo modelo de arena imposto com a reforma dos estádios, essas cenas ficaram cada vez mais difíceis de serem reproduzidas nos atuais moldes do futebol brasileiro. Talvez pela violência crescente ou por uma pura briga de interesses entre os dirigentes dos clubes, a ideia de adotar um espaço exclusivo para as torcidas mistas nos estádios fique cada vez mais em segundo plano no espetáculo.

O que os torcedores acham?

Com três gols de Hugo, o Vitória não encontrou dificuldades para vencer o rival Bahia na segunda fase do chamado "Torneio da Morte" do Campeonato Brasileiro de 1989. A partida era válida pela sétima rodada e foi o primeiro clássico do técnico de segurança e torcedor do Vitória Edinelson Figueiredo, de 35 anos.

"Meu sonho era ir na Fonte Nova. Eu só conhecia pela TV e, em um belo final de semana, meu primo Carlos Alberto veio para Salvador visitar os parentes. Fomos na Ribeira, no domingo, e lá pra umas 14h ele levantou e começou a se despedir de todos que estavam em uma mesa de cerveja. Foi ai que ouvi a voz da minha saudosa mãe Áurea Tibério dizendo: 'Edinelson, você não quer conhecer a Fonte Nova? Porque não vai com Carlos Alberto?' Meus olhos brilharam e eu cheguei a dizer: 'vamos logo antes que ela desista, já que eu estava muito muito mal na escola com 9 anos", relatou ele. 

"Chegando na Fonte Nova eu não acreditei que eu tava ali, uma emoção em ver o estádio. Bola rolando e, quando teve o primeiro gol do Vitória, eu olhei para o lado e vi todos se abraçando. Sentado ao meu lado estava um torcedor que foi às lágrimas com esse primeiro gol do Leão. Meu amor eterno estava ali. Na torcida mista, eu achei incrível ali todos juntos, sem brigas. Até os xingamentos eram 'light'. Os torcedores davam opinavam sobre os defeitos dos adversários e vice-versa", comenta o torcedor. Para Edinelson, uma possível volta da torcida mista seria interessante se a segurança dos torcedores fosse levada em consideração como fator preponderante para a permanência do setor.

"Eu sempre ficava torcida na mista, pois era um ambiente tranquilo e animado. Mas, depois das organizadas levarem ao pé da letra a paixão, ficou difícil. Nos dias de hoje, eu não sou a favor, pois a violência chegou a um ponto em que não temos como controlar. Eu mesmo não vou mais ao estádio quando o mando de campo é do rival, devido a esses problemas. Tenho saudades da antiga Fonte Nova quando não tinha problemas, bebíamos juntos, fora e dentro do estádio", ressaltou. "Se tivesse um controle de maior, com a responsabilidade dos envolvidos também na área externa, eu seria a favor", declarou o rubro-negro.

Torcedor fanático do Tricolor, o estudante de Direito Rodrigo Moitinho, de 22 anos, nunca deixou de acompanhar o clube em jogos na capital baiana. Na ausência de espaços destinados aos torcedores das duas equipes, ele já teve que assistir clássicos estando infiltrado na torcido do Vitória. O curioso é que Rodrigo namora a também estudante Jéssica Rocha, de 21, que é torcedora rubro-negra.

 

"Eu fui participar da gincana do meu antigo colégio do terceiro ano há algum tempo atrás, cuja prova era entrar com os jogadores. Minha equipe acabou não conseguindo entrar e então um funcionário do clube tentou nos ajudar, mas acabamos impossibilitados de entrar com os atletas. Perguntamos se poderíamos assistir o jogo na arquibancada e ele deixou. Foi tenso porque eu sou Bahia e estava no meio da torcida do Vitória e não podia expressar minha torcida. Fiquei com muito medo. Sorte que o marido de minha madrinha estava lá e eu pude voltar pra casa", disse ele. 

Mesmo diante de situações como essa, Rodrigo diz que é contra a volta do setor. "Se trata de Ba-Vi, um grande, talvez o maior clássico do Nordeste. As duas torcidas tratam o clássico como uma verdadeira 'guerra', por assim dizer. A torcida mista, apesar de ser uma ideia boa de tentar trazer um bom convívio entre as torcidas, para esse clássico, não acho que seja bom", afirmou. "Do jeito que o país está, onde qualquer coisa é motivo de briga para impor o que você pensa, é preferível que não. Já pensou, eu, torcedor do Bahia, no meio da torcida do Vitória e gritar gol? Com certeza eu seria linchado, o mesmo seria com algum torcedor comum do Vitória que está no estádio para ver seu time jogar. Isso não é questão de segurança e sim de educação e respeito por parte de ambos os torcedores", defende o tricolor.

Recentemente, o mais próximo de um espaço de torcida mista que existiu foi o setor do Lounge Premium da Arena Fonte Nova. No jogo que marcou a reinauguração do estádio, torcedores de Bahia e Vitória dividiram o mesmo espaço. Porém, o preço não foi dos mais acessíveis e o local ficou povoado apenas por pessoas com alto poder aquisitivo e convidados, deixando de lado o passado onde a grande massa de torcedores ficavam lado a lado. No jogo deste final de semana, o espaço foi restrito apenas para torcedores do Bahia, acabando de vez com a possibilidade da existência de um local que pudesse proporcionar a experiência. 

Marcelo Sant'Ana afirma que torcida mista será adotada quando Bahia e Arena julgarem interessante

"O racismo das arquibancadas, onde azul, vermelho e branco não se mistura a vermelho e preto, é mais um estímulo à intolerância. Qual o valor de um espetáculo onde separam pais de filhos, famílias, amigos?" - Esse foi um trecho da coluna escrita por Marcelo Sant'Ana, em abril de 2014, quando ainda era jornalista do jornal Correio. Questionado pelo Metro1 sobre essa opinião, o atual presidente do Esporte Clube Bahia afirmou não ter mudado de ideia, apesar de não ter adotado a torcida mista para o clássico deste sábado. "Eu mantenho todas as opiniões que tinha enquanto jornalista. O Bahia, inclusive, já acertou com a Arena qual setor terá torcida mista, quanto ingressos serão e etc. Não vamos fazer no Bahia por reciprocidade. O Vitória teve dois clássicos no ano como mandante e não fez absolutamente nada pelo torcedor do Bahia. Pelo contrário, tivemos até mais dificuldades do primeiro para o segundo clássico, tanto que até eu fui na arquibancada ver as queixas", afirmou.

Ainda segundo Marcelo, a prática será implementada assim que o Bahia e o presidente da Arena, Sinval Andrade, julgarem interessante de acordo com o clima e aceitação do público, independente do adversário no jogo. "A gente sabe que a aceitação neste clássico seria ruim. O nosso objetivo com a torcida mista é reaproximar as pessoas, não criar desconforto. Continuamos favoráveis, mas quando for um estímulo dentro do jogo e para o espetáculo, mas não um problema. Como esta decisão cabe e parte do mandante, o Bahia se articula somente com a Arena e com as autoridades envolvidas no jogo", pontuou.

Presidente rubro-negro defende torcida mista e se diz aberto à conversas

"Sou absolutamente a favor, pode escrever com todas as letras que o presidente do Vitória é a favor da torcida mista", disparou o atual dirigente do Leão da Barra. No comando do Vitória desde abril deste ano, o presidente Raimundo Viana declarou ser totalmente favorável ao espaço das torcidas mistas. "Em primeiro lugar, eu sou radicalmente contra a chamada torcida única, como vem se configurando em alguns estádios do Brasil. Eu sou absolutamente a favor da torcida mista. Tem que ser metade-metade. Acho essa coreografia e essa plastificação uma coisa encantadora. Quando você vê o mar rubro-negro e o mar tricolor, quem acaba ganhando é o espetáculo", declarou o presidente, em entrevista ao Metro1. Viana foi eleito para o que ele mesmo chama de "mandato-tampão" até a escolha de um novo comandante no clube. Ele assumiu o lugar depois de ser escolhido pelos conselheiros do clube, logo após a renúncia do ex-presidente Carlos Falcão. 

Questionado sobre a possibilidade do setor destinado à união dos torcedores ser um assunto em discussão no clube, Raimundo Viana ressaltou que o Vitória mantém o foco no Campeonato Brasileiro. "Não é um assunto na ordem de prioridade porque estamos focados na vaga na Série A e na busca do título. Porém, vejo com bons olhos que se coloque isso na mesa de entendimento", disse ele.

O presidente também criticou os acontecimentos de violência que ocorrem entre as torcidas organizadas dos dois clubes. Recentemente, os dois principais grupos de torcedores organizados dos clubes baianos Bamor (Bahia) e Os Imbatíveis (Vitória), foram suspensos do Ba-Vi e do restante da temporada. "Ficarmos reféns de eventuais dissidências e presos em esporádicos acontecimentos de violência não é uma solução. Você não pode penalizar uma comunidade inteira em razão de desvios de comportamento de determinados grupos", defendeu o presidente do clube. 

Segundo a Polícia Militar, torcida mista é viável nas arquibancadas e segurança é garantida

De acordo com o Tenente Coronel Costa Ferreira, do Batalhão Especializado em Policiamento de Eventos (Bepe), a Polícia Militar não tem restrição para que se exista torcida mista nas arquibancadas, eles apenas cumprem as regras administrativas. "Na verdade a normatização interna fica sob a responsabilidade do clube mandante e da administração do estádio, eles estipulam as regras e nós, como segurança pública, damos o apoio necessário para que sejam cumpridas. Se for cumprido, teremos o policiamento necessário", afirmou.

Questionado pelo Metro1 sobre o histórico de outros clássicos ele afirmou que o grande problema não é no interior do estádio e sim na chegada e saída dos torcedores, por conta do vandalismo de torcidas organizadas. "O evento transcorre de maneira brilhante e tem sido prejudicada pela mentalidade de uns torcedores radicais agindo com violência. Tudo é possível se realizar o que precisamos é ter um respeito e o cidadão saber se portar e saber o que é limete, isso independe da condição do futebol", disse.