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Budweiser, Cannes e a vergonha do ano: como uma campanha “genial” da agência África virou exemplo de oportunismo barato
Internacional
Budweiser, Cannes e a vergonha do ano: como uma campanha “genial” da agência África virou exemplo de oportunismo barato
Uso de trechos musicais sem licenciamento rende prêmio a campanha e revolta à indústria fonográfica

Foto: Divulgação
O que parecia uma grande vitória para a Budweiser no Festival de Cannes 2025 rapidamente se transformou em um dos maiores vexames da história recente da publicidade global. A campanha “One Second Ads”, criada pela agência Africa, de São Paulo, e liderada criativamente por Sérgio Gordilho, até subiu ao palco para receber o Grand Prix na categoria Rádio & Áudio. Mas bastaram 48 horas para a indústria perceber o que, de fato, estava sendo celebrado: uma manobra para lucrar com a cultura pop sem pagar um centavo aos artistas que a sustentam.
A mecânica da campanha era simples – e, à primeira vista, brilhante: vídeos de 1 segundo no TikTok reproduzindo trechos iniciais de hits de artistas como Beyoncé, Taylor Swift, The Beatles e Foo Fighters, desafiando o público a adivinhar a música. O “pulo do gato”? Segundo a própria Africa declarou no material de inscrição ao Cannes Lions, os clipes de apenas 1 segundo dispensariam qualquer pagamento de licenciamento por uso de músicas protegidas por direitos autorais.
Ou seja: usaram a força emocional e simbólica de artistas consagrados sem remunerá-los. E ainda transformaram isso em case publicitário premiado.
Mas o que era uma “sacada” rapidamente foi desmascarado como exploração criativa. Bastou o conteúdo da inscrição vir à tona onde a agência se orgulha de ter evitado custos com licenciamento para choverem críticas do mercado, de músicos, advogados, agentes de direitos autorais e veículos especializados. “As músicas eram a campanha, e não pagaram um centavo por elas”, denunciou a plataforma Music Ally. A agência chegou a vangloriar-se: “zero em custos de música cortada e todos os custos de licenciamento evitados”.
A reação foi imediata e devastadora. Representantes da indústria musical classificaram a iniciativa como um exemplo cristalino de oportunismo corporativo. A Sony Music abriu uma investigação formal por violação de direitos. A AB InBev, controladora da Budweiser, teve que correr para apagar o incêndio com um pedido público de desculpas, comprometendo-se a revisar a conduta da campanha. Em vez de case de sucesso, o “One Second Ads” virou símbolo de um modelo predatório de criação publicitária, que lucra explorando a cultura e os artistas mas se recusa a remunerá-los.
Mais grave ainda é o silêncio ensurdecedor da Africa diante do escândalo. Nem Sérgio Gordilho, Chief Creative Officer da agência, nem outros executivos se pronunciaram para defender ou contextualizar a escolha criativa que transformou uma premiação histórica em um prejuízo reputacional incalculável para a Budweiser e um tiro no pé para a credibilidade da publicidade brasileira no exterior.
O saldo é claro: a campanha, antes premiada, agora está manchada. A Budweiser, que se posiciona como “aliada da música e dos artistas”, amarga críticas públicas e danos à sua imagem. E a Africa, que deveria estar celebrando uma vitória, amarga o peso de ter assinado uma das campanhas mais desonestas e autodestrutivas do ano.
Em nota, a agência Africa afirmou que "o objetivo dessa campanha era homenagear os super fãs que reconhecem músicas de seus ídolos em apenas um segundo. Desde a sua fundação, a Africa Creative mantém uma relação profunda com o universo do entretenimento, construída ao longo de anos com apoio e investimento consistentes a artistas, festivais e projetos culturais. Pedimos desculpa e estamos trabalhando para resolver a questão."
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