Destino incerto: após 13 anos de orla mergulhada no abandono, Prefeitura promete requalificar praias da capital

Reportagem publicada originalmente no Jornal Metropole em 28 de setembro de 2023

Ponto de referência na orla de Itapuã, a Sereia de Mário Cravo representa pescadores, trabalhadores que tiram o sustento na faixa de areia da capital baiana. Foi lá que ocorreu, no último dia 14, um protesto organizado por diversos barraqueiros, após a Prefeitura de Salvador decidir que fará o recolhimento de seus materiais de trabalho da orla marítima. A decisão vem junto com um projeto, elaborado pela Fundação Mário Leal Ferreira, que promete requalificar as praias de Salvador.

A expectativa era que a novidade seria vista com bons olhos por banhistas e trabalhadores da faixa de areia de Salvador, afinal foram 13 anos com a orla mergulhada no descaso após a derrubada das barracas. A prefeitura agora estuda instalar as chamadas guarderias, que seriam espaços subterrâneos - semelhantes aos que já existem em locais como Praia do Forte - para que os ambulantes armazenem diariamente seu equipamento de trabalho. A Secretaria de Ordem Pública (Semop), no entanto, destaca que o projeto ainda requer estudos de impacto ambiental, assim como parte estruturantes para garantir a segurança no uso das instalações.

O modelo atual da iniciativa, no entanto, não é considerado positivo pelo presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil - Departamento da Bahia (IAB-BA), Daniel Colina. Para ele, retirar o equipamento diariamente é algo descabido e criar espaços para guardá-lo de praia não passa de improvisação. “A requalificação da obra deve ser o resultado do planejamento participativo e multiprofissional. Salvador é uma península abençoada pela Baía de Todos os Santos, ela deve encarar o planejamento deste território em conjunto ao governo estadual e federal. O IAB está disposto a contribuir”, disse ao Jornal Metropole.

"Desfavelizar"

Por outro lado, a Semop defende a eficácia do projeto. Um dia antes do protesto dos barraqueiros, o secretário Alexandre Tinôco havia afirmado, em entrevista à Rádio Metropole, que ao guardar diariamente os materiais dos ambulantes a prefeitura evitará a “favelização” das praias da capital baiana.

Depois, em nota, a secretaria explicou que emergencialmente o material deverá ser retirado da faixa de areia e colocado em uma casa alugada pela gestão municipal, na Praia de Piatã. Ainda de acordo com a Semop, no dia seguinte, um caminhão disponibilizado pela prefeitura faria a entrega dos pertences para que os ambulantes pudessem trabalhar normalmente. O receio dos trabalhadores é que essa logística acabe danificando ou até trocando o material.

Não só isso, os ambulantes questionam também o motivo pelo qual não foram convidados para participar do desenvolvimento do projeto. “A prefeitura fala hoje das guarderias para ajudar a classe trabalhadora da faixa de areia, mas pra essa guarderia acontecer, primeiro precisamos participar deste projeto junto à Fundação Mário Leal”, afirmou Maurício Batista, representante dos barraqueiros.

O assunto tem gerado discussão na Câmara Municipal de Salvador. O ouvidor-geral da Casa, o vereador Augusto Vasconcelos (PCdoB), encaminhou um ofício questionando a Semop sobre as medidas. Vasconcelos defendeu que o mais importante é que o projeto esteja também de acordo com os interesses dos trabalhadores. “Os espaços são públicos, nós precisamos ordenar sim, mas compatibilizando com os interesses da maior parte da cidade”, disse ao Jornal Metropole.

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