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Falsificaram um padre

Falsificaram um padre

Toda eleição tem seu comediante de estimação. Nessas eleições, a personagem insólita nacional é um padre fake, candidato à Presidência da República pelo PTB, um dos partidos da base de apoio do presidente Jair Bolsonaro

Falsificaram um padre

Foto: Reprodução

Por: Malu Fontes no dia 29 de setembro de 2022 às 10:17

Toda eleição tem seu comediante de estimação. Enéas Carneiro, Levy Fidélix, Cabo Daciolo, o do ‘gloria a deushs’ de 2018, e as bizarrices locais de sempre, algumas voluntariamente risíveis. Outras, sem se dar conta. Nessas eleições, a personagem insólita nacional é um padre fake, candidato à Presidência da República pelo PTB, um dos partidos da base de apoio do presidente Jair Bolsonaro. O último debate eleitoral da campanha, o da Rede Globo, inscreverá definitivamente na história da corrida presidencial de 2022 o Padre Kelmon. 

Fisicamente, o tal padre é um clone bronzeado de Augusto Aras, o procurador-geral da República, como apontou o jornalista Reinaldo Azevedo. Politicamente, é uma dessas aberrações que surgem nas campanhas. Nessa eleição,
a função do bizarro da vez é ser o que se chama de linha auxiliar de Jair Bolsonaro nos debates. O padre fake está no jogo para ser escada, para chutar a bola dos temas conservadores e terraplanistas para o candidato presidente. 

Se Bolsonaro já não fosse a própria banda B da campanha, o Padre Kelmon seria. Como a vaga está autopreenchida, o pseudossacerdote faz as vezes do membro do Q Anon na televisão, incorporando a vida que há nos embriões abortados, a ameaça do comunismo e do globalismo e a catequização das crianças na escola pela ideologia de gênero. Está aí para ser a versão 2022 da mamadeira de piroca. Mas de onde saiu esse padre falsificado?

Kelmon tem 45 anos e e foi doado à campanha presidencial por Roberto Jefferson, o Bob dos instintos primitivos do Mensalão e do Centrão, figura lendária da recente política brasileira, desde Fernando Collor. O candidato a presidente pelo PTB era o próprio Jefferson, mas sua candidatura foi barrada pela Procuradoria-Geral da República e pelo Tribunal Superior Eleitoral. Condenado por corrupção, preso e solto recentemente, responde a inquéritos por ações antidemocráticas, por ameaças ao Supremo Tribunal Federal, e está legalmente inelegível

Para os baianos, a presença do padre nas eleições tem uma particularidade. O autointitulado sacerdote é baiano e
diz ele que sua paróquia fica na Ilha de Maré, na Baía de Todos os Santos, território pertencente ao município de
Salvador. Quem mora na ilha diz ter visto o sujeito por lá raríssimas vezes. Agora que Kelmon é candidato e famoso nacionalmente, apareceu também uma reforma no espaço que ele chama de paróquia, na ilha. Dinheiro para a obra é o que não deveria faltar, mas parece que vai.

A igreja é do peru

O PTB tem cerca de um milhão e meio do fundo partidário para gastar com a candidatura à presidência, mesmo sendo com esse tipo de candidato. No entanto, a imprensa já futucou e descobriu que 80% desse valor foi gasto com uma empresa que há tempos costuma prestar serviços a Roberto Jefferson, com atuação em Brasília e endereço em Cuiabá. Sobre o pertencimento episcopal de Kelmon, a piada pronta só melhora. Ou piora, dependendo de como queiramos interpretar.

Após anunciar-se em cadeia nacional como padre da Igreja Católica Ortodoxa, o padre falsificado foi desmascarado. Em nota, as autoridades que representam a instituição afirmaram em nota que o sujeito não pertence a nenhuma das organizações ortodoxas que funcionam no Brasil. A isso, o baiano reagiu dizendo fazer parte da Igreja Católica Apostólica Ortodoxa do Peru. Sim, do Peru, com maiúscula, do país. Para melhorar as credenciais, a cereja do bolo: o padre recebeu mais de cinco mil reais deauxílio do governo federal na pandemia.

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