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Um tributo a Pedro Santinho

Um tributo a Pedro Santinho

Quando morre um santo, o luto em nosso coração é de um pesar doce e calmo e não há tristeza que não se desfaça

Um tributo a Pedro Santinho

Foto: Reprodução

Por: Helenita Monte de Hollanda no dia 19 de outubro de 2023 às 00:00

A viagem diária de Caldas do Jorro a Olhos d' Água em Tucano, no nordeste baiano, era árida e poeirenta. A pele já escaldava ao amanhecer! Jorro, Mandaçaia, Crenguenhém, Cansanção... Lugares de nomes mágicos davam-me o roteiro naquela terra nova e bela onde o Sertão se revelou para mim da forma mais solitária de ser-tão e de, demasiadamente, sentir a paisagem humana, a mais rica e poética paisagem humana, que pontuava o barro duro e esburacado das estradas levando-me à experiência humana mais encantadora que se pode ter e que chamo de SUBLIME ALEGRIA DA AFEIÇÃO. 

Conhecer pessoas como Pedro Santinho trouxe sentido à extravagância de ser médica em local remoto e pobre. O contato com saberes que, sem se opor a minha ciência revelavam a fé e a crença do nosso povo, foi tempero a conferir novo e delicioso sabor ao guisado da vida. Lá ia eu, sempre que possível, ao sítio de Santinho, aprender rezas, ouvir causos de Dona Josefa, sua mulher, entretida no tear, apreciar a fé de um homem e o seu poder de curar pessoas e obrar "milagres". Um rezador bom, o velho de sorriso infantil, o pobre mais rico que já conheci com a sua alegria e orgulho em poder ser serviço a serviço do seu próximo, foi uma das figuras humanas mais inesquecíveis com quem me pus em contato. Fez-me voltar àquela lonjura após 5 anos para revê-lo e absorver mais das suas histórias, do seu conhecimento de um deus que lhe conferira o dom de curar pela oração.

Pedro Santinho... por ele eu posso dizer que conheci um puro de coração e em suas ações. De toda a minha experiência em pesquisa de campo da nossa cultura popular permitida pelo ser médica que me levou a lugares inimagináveis, a visita a Pedro Santinho foi a única que se repetiu. Em 2017, o amor por ele levou-me de volta àquele lugar e permitiu-me o último abraço naquele que se despediu da terra poucos meses depois da nossa despedida ingênua planejando reencontros. Quando morre um santo, o luto em nosso coração é de um pesar doce e calmo e não há tristeza que não se desfaça em uma maneira de contemplação admirada da própria santidade. Pedro Santinho - um nome, um destino... Em nenhuma melhor pedra se poderia edificar uma crença; em nenhuma melhor forma de Santidade se poderia edificar uma devoção.

Helenita Monte de Hollanda, médica, psicanalista, estudiosa da cultura popular, autora dos livros “Como diz o ditado…” e “Com dois te botaram/Com três eu te tiro – Um estudo sobre religiosidade popular suas rezas, benditos e excelências”.

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