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O vírus e o protozoário segundo o feminismo

O vírus e o protozoário segundo o feminismo

A doutora Nise repetiu involuntariamente a exposição, considerada perversa, a que já tinha sido submetida a médica Mayra Pinheiro, a capitã Cloroquina. Ambas, coitadas, seriam mulheres vítimas da cultura opressora desse governo, instrumentalizadas por um grupo de machistas maus

O vírus e o protozoário segundo o feminismo

Foto: Reprodução

Por: Malu Fontes no dia 03 de junho de 2021 às 12:33

A audiência ativista que comenta nas redes o BBB Brasília, o reality transmitido pela TV Senado, se dividiu na terça-feira. Qual era a moral da história do episódio do dia? Era o quanto o patriarcado daqueles homens héteros, brancos, cis, normativos e etc. é machista e opressor, com o troféu de vilão da tarde indo para o senador baiano Otto Alencar, por encurralar a oncologista Nise Yamaguchi? Vulnerável, por ser mulher, não branca e etc. a médica teria sido humilhada com crueldade até revelar ao país a façanha de ter um diploma de medicina sem aprender direito noções elementares de biologia no ensino médio, como a diferença entre um vírus e um protozoário. 

Ou a moral do episódio era mais uma confirmação do quanto o patriarcado do governo misógino do presidente Jair Bolsonaro massacra as mulheres que integram suas equipes e as entrega à ridicularização no espaço público? Para os defensores dessa tese, a doutora Nise repetiu involuntariamente a exposição, considerada perversa, a que já tinha sido submetida a médica Mayra Pinheiro, a capitã Cloroquina. Ambas, coitadas, seriam mulheres vítimas da cultura opressora desse governo, instrumentalizadas por um grupo de machistas maus. Mulheres de esquerda adotaram esse viés interpretativo. 

Não, não vem ao caso se Eduardo Pazuello e Fábio Wajngarten já tivessem tido suas falas desconstruídas, sido espremidos, interrompidos, confrontados, criticados, na mesma CPI. Pazuello até mal passou, ensinando ao país o que era a síncope vasovagal. Mas, homens que são, claro, se apertados foram com perguntas mais enfáticas dos opositores, isso nada mais era que a ordem natural dos rituais de inquirição a machos. As perguntas feitas a Nise e Mayra foram, na linha de raciocínio de quem ama a contundência de Otto Alencar, mas cospe na misoginia do bolsonarismo, consequências do modo como esse governo vê a condição feminina. E perguntam: por que essas mulheres se deixam usar como bucha de canhão para trucidar a ciência? 

LUMENIZAÇÃO – Do mesmo modo que o identitarismo pautou o BBB21, o glossário do feminismo à la Lumena foi adotado pelos comentadores do BBB Brasília nas redes. Pululavam nos comentários palavras da bolha feminista, como manterrupting, mansplaining, gaslighting, relacionadas à interrupção que os homens fazem à fala das mulheres, à mania que têm de se acharem mais sabedores das coisas e explicarem o mundo para elas e à distorção masculina de informações dadas por uma mulher, deixando-a insegura quanto a si mesma. Foi uma epifania ver feministas da esquerda compartilhando os mesmos sentimentos de homens bolsonaristas e de mulheres do lar, condenando uma suposta agressividade de Otto Alencar e argumentando falta de respeito. Há quem tenha visto outra coisa: Nise sendo interrompida e contradita porque respondia perguntas com tergiversações negacionistas e anticientíficas. Mas, assim é se lhe parece. 

No núcleo alucinado da CPI, mais do mesmo. O coronel de Rancho Queimado, Luiz Carlos Heinze (RS), repetindo again e again a cantilena de suas apostilas com estudos e efeitos milagrosos do kit cloroquínico. E Eduardo Girão (CE) apelando aos coleguinhas para apoiar o país como sede da Copa América, para gerar milhares de empregos, segundo ele. Ah, mas vai ter Olimpíada no Japão... Sim, mas o Japão não está se aproximando de meio milhão de mortos e nem está com uma média diária de cerca de 2.000 mortos. Ah, mas está havendo Brasileirão, Copa Brasil... Não deveria, mas um torneio internacional vai trazer equipes de vários países do mundo em um contexto em que se cobra do país barreiras sanitárias internacionais para evitar a entrada de novas cepas. 

À parte isso tudo, uma das cerejas do bolo da CPI foi o embate de humor involuntário gerado por uma pergunta de Heinze à infectologista Luana Araújo, na sessão de quarta-feira, sobre um estudo financiado por uma atriz pornô: “Não conheço, senador. Realmente, está fora da minha alçada”. A temporada promete.