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Mais Cosmes de Farias em Cosme de Farias

Mais Cosmes de Farias em Cosme de Farias

Usarei este espaço para evocar sim a figura de Cosme de Farias, na esperança de que seu exemplo, tantas vezes esquecido ou nem sempre lembrado, sirva de inspiração aos meninos e meninas do lugar que leva seu nome

Mais Cosmes de Farias em Cosme de Farias

Foto: Reprodução

Por: James Martins no dia 21 de setembro de 2023 às 00:00

As notícias da expansão territorial da violência em Salvador me levaram a ler esses dias, em situação de tragédia, o nome do bairro Cosme de Farias, sagrado nome. Tanto pelo bairro em si, berço de tanta gente boa, como por seu patrono — o advogado dos pobres, rábula do povo, o “major” Cosme de Farias, figura impoluta da baianidade. E não pude deixar de lembrar que setembro é dia de Cosme, o santo gêmeo, patrono do patrono que, por sinal, também era gêmeo, sendo que seu Damião morreu ainda na infância. E, portanto, fiquei achando que é simbolismo demais pra deixar passar e decidi que, mesmo sem data redonda ou outra dessas pequenezas que costumam reger as pautas dos periódicos, usarei este espaço para evocar sim a figura de Cosme de Farias, na esperança de que seu exemplo, tantas vezes esquecido ou nem sempre lembrado, sirva de inspiração aos meninos e meninas do lugar que leva seu nome. Assim também os de outros lugares.

De pouca instrução formal, o mulato Cosme de Farias é considerado o último rábula (advogado sem diploma) da Bahia. E, apesar de ter sido também vereador e deputado (eleito aos 96 anos, o mais velho do país), foi nesta função que fez história, sempre defendendo os mais pobres, os rejeitados, os desvalidos. Dele são essas palavras, dignas de um Castro Alves: “Preferi o lado mais fraco para defender um ideal mais forte: a liberdade”. Nunca esteve no tribunal para acusar, sempre para defender, e deu ao Direito um teor francamente humanista. Suas histórias tornaram-se verdadeiras lendas, como no julgamento em que desfeiteou o famoso criminalista Caio Monteiro de Barros. “Senho juiz, senhores jurados, quem supor que o Direito…”, disse o paulistano. E o major, do alto de seu curso primário: “Supuser, doutor, o verbo é irregular. O senhor não sabe português, quanto mais Direito”.    

É personagem de Jorge Amado, em Tenda dos Milagres, não como "Tadeu filho de Dorotéia (Iaba)", como diz seu verbete na Wikipedia, mas como o major Damião de Souza. Criou a Liga Baiana contra o Analfabetismo. Apreciava uma boa cabrocha e uma cachacinha. E por falar nisso, encerro com uma propaganda: meu amigo Adriano Viana, nascido e criado em Cosme de Farias, abriu há pouco o Café & Câmera, num anexo da Igreja da Ordem Terceira do Carmo. Clima incrível, capaz de acalmar o coração mais irrequieto e agressivo (inclusive o meu). É disso que estou falando. A Bahia tá viva ainda lá.