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Golpistas criam "faculdades" para ensinar aprendizes de criminosos a lesar vítimas

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Golpistas criam "faculdades" para ensinar aprendizes de criminosos a lesar vítimas

Tutoriais, hashtags, lives e manuais fazem parte do leque de ferramentas disponibilizadas por instrutores de estelionato digital, em modalidades cada vez mais refinadas

Golpistas criam "faculdades" para ensinar aprendizes de criminosos a lesar vítimas

Foto: Freepik

Por: Ismael Encarnação e Juliana Lopes no dia 30 de outubro de 2025 às 10:00

Código de entrega falso, ligação que finge ser do banco, um boleto que parece mas não é real, ameaça de bloqueio de conta, perfis fake verificados. Todo dia o brasileiro é vítima de um método mais refinado de golpe. E é claro que os golpistas aprendem isso tudo na própria internet. Uma busca rápida nas redes sociais por hashtags específicas é suficiente para esbarrar em anúncios de cursos, tabelas de preço de cartões clonados, grupos de venda de contas laranja e de dados de terceiros.

Parece absurdo, mas é tudo naturalizado e aliado a muita ostentação, carros e bebidas caras e leques de dinheiro vivo. Mais do que a promessa de grana fácil, essas postagens reforçam um estilo de vida. Na linha do “seja seu próprio chefe” e “trabalhe sem sair de casa”, os criminosos falam de estelionato como se fosse um empreendimento digital qualquer e se identificam como uma comunidade: a tropa do 7 (fazendo referência a 171). O vocabulário corporativo toma conta. “Método”, “resultado garantido” e “parceria” são alguns dos termos usados para atrair novos “alunos”. 

Mesmo online, a escola de golpes tem rendido bons frutos - ao menos, para a famosa tropa do 7. Nos últimos 12 meses, um em cada três brasileiros sofreu golpe na internet, segundo pesquisa do Datafolha. Por aqui, na Bahia, as denúncias de golpes digitais também se multiplicam: a Polícia Civil registrou cerca de 20 mil ocorrências só neste ano, um aumento de 17% quando comparado aos casos de estelionato virtual do ano passado. Nota 10 para a escola do crime.

Esse avanço mostra que o golpe deixou de ser amador, se profissionalizou – e, como em tantas outras áreas, com dicas e cursos nas redes sociais. Há venda de roteiros, técnicas, “graduações” e até “especializações”. No Procon-BA, o salto das denúncias confirma a tendência de profissionalização, com perfis de vítimas cada vez mais variados e golpes mais sofisticados.

Reprovados no combate ao golpe

Nem os recursos da polícia nem a legislação brasileira avançam na mesma velocidade que a tropa do 7. A presidente da Comissão de Tecnologia e Informação da OAB-BA, Tamiride Monteiro, cita leis como a Carolina Dieckmann, o Marco Civil da Internet e a LGPD como marcos importantes, mas ressalta que “há lacunas e a necessidade de maior cooperação internacional e de responsabilização das plataformas”.

Segundo ela, o cenário envolve sim o descuido dos usuários, mas também “a sofisticação das estratégias criminosas”, impulsionadas por inteligência artificial e engenharia social. Os tais cursos prometem explicar, por exemplo, o passo a passo para invadir computadores de terceiros, clonar contas, aplicar fraudes, lavar dinheiro utilizando aplicativos de venda ou converter saldo em dinheiro via Pix.

As redes sociais atuam de modo reativo. As postagens, que muitas vezes chegam a ser monetizadas pela sua alta popularidade, são retiradas somente após denúncias, embora haja todos os indícios de violação das políticas de uso das plataformas mais utilizadas. A reportagem buscou um posicionamento do Youtube e Meta, onde encontrou conteúdo prometendo ensinar golpes, mas não teve retorno até o fechamento da matéria.